Insatisfeito com as explicações da Agência Nacional de
Energia Elétrica (Aneel) e da Companhia Energética do Ceará (Coelce)
acerca do aumento na conta de luz, em vigor desde o dia 22 de abril
deste ano, o deputado federal Chico Lopes aponta para um encaminhamento
jurídico da questão, em busca de uma solução para o caso. "Vamos nos
mobilizar, convocar a sociedade civil para fazer pressão contra esse
reajuste tão alto. Como as explicações da Coelce e da Aneel não
satisfizeram, uma das medidas a serem tomadas será entrar com uma ação
na Justiça", declarou Lopes ao término da Audiência Pública realizada na
manhã de ontem na Comissão de Defesa do Consumidor, da Câmara dos
Deputados em Brasília.
"As explicações da Coelce e da Aneel não satisfizeram. A Aneel não
conseguiu explicar por que a Coelce pediu em torno de 14% de aumento e
eles deram 17%. Foram lá, foram cá, mas não vejo justificativa nenhuma.
Se a Coelce pediu 14% de reajuste e a Aneel deu quase 17%, a Coelce
deveria pôr os funcionários pra correr, porque não são competentes.
Fizeram uma planilha pedindo um reajuste que a própria agência que
deveria defender o consumidor deu um percentual maior. Três pontos
percentuais é uma diferença muito grande, em volume de dinheiro pago
pelos consumidores de energia no Ceará", argumentou o deputado.
Mobilização
Conforme disse, ainda será estudada a forma de questionar o reajuste,
via ação judicial. "Para que seja revisto esse reajuste que prejudica os
consumidores residenciais e as empresas cearenses, não temos outra
alternativa a não ser bater às portas do Judiciário. Já que tanto a
Coelce quanto a Aneel e ainda o Ministério das Minas e Energia fecharam a
porta para qualquer possibilidade de revisão do índice, vamos tentar
judicialmente e conversar com todos os setores que trabalham em defesa
do consumidor e ainda com a Federação das Indústrias do Estado (Fiec),
para definir a forma de fazer isso, com todo o cuidado e argumentos para
que o reajuste seja derrubado e o percentual seja diminuído", disse.
Para ele, colocar a seca como única justificativa para os aumentos da
energia "é como banalizar toda uma discussão sobre preço do insumo no
Brasil". "A seca não é a única culpada", destacou.
"Mais transparência"
Também presente à audiência pública na capital federal, o consultor
especialista em energia Jurandir Picanço, que representou a Fiec, pediu
mais transparência nos dados tanto da Aneel quanto da Coelce. "Para
obter os números da Aneel e da Coelce, eu fui obrigado a recorrer ao
Portal da Transparência", afirmou.
Segundo ele, a expectativa da indústria cearense era de que o reajuste
ficasse em torno do índice da inflação. Durante a audiência, o consultor
perguntou diretamente à Aneel porque o valor do reajuste foi superior
ao solicitado pela própria concessionária, ao que foi informado de que,
neste ano, com a crise no abastecimento de água, a Coelce, bem como as
demais distribuidoras, foi obrigada a comprar energia no mercado de
curto prazo, que duplicou seus preços nos últimos meses. Picanço não
descarta que a Fiec também possa entrar judicialmente contra o reajuste
de 2014. "Vamos avaliar. Mas, por enquanto, não há nada de concreto",
afirmou.
Aneel e Coelce se justificam
"O reajuste depende de cada distribuidora e varia de acordo com uma
série de fatores. No caso de 2014, é a crise de abastecimento de água e a
utilização das termoelétricas que elevam o custo das tarifas, que em
todos os Estados deverão ter reajuste na casa de dois dígitos", declarou
o superintendente de regulamentação da Aneel, Davi Antunes Lima,
contrariando declaração da própria Agência de que não havia tendência de
dois dígitos nos reajustes deste ano.
Pelo lado da Coelce, o diretor de Regulação, José Alves de Melo Franco,
explicou que, em 2014, foi aplicado o reajuste sobre a tarifa cheia.
Segundo ele, em 2013, o aumento da tarifa no Ceará deveria ter sido de
11,36%, mas com a redução tarifária para o consumidor que foi aplicada
entre 2011 e 2012, o incremento de 2013 foi de apenas de 2,68%. "Agora, o
reajuste foi feito em cima dos 11, 36% da tarifa cheia, sem o desconto,
o que gerou o reajuste médio de 16,5%", destacou.
Já o diretor do departamento de gestão do setor elétrico do Ministério
das Minas e Energia, Marcos Franco Moreira, presente à Audiência,
confirmou que "há uma grande complexidade na formação da tarifa de
energia no Brasil" e que é muito difícil para o consumidor entender
estes cálculos. "De acordo com os dados da Aneel, 23% da conta de luz é
composta por impostos pagos pela distribuidoras - ICMS e PIS/Cofins",
disse.
Ao passo que o coordenador de regulamentação de Mercado do Ministério
da Justiça, Carlos Chagas Ferreira de Souza, argumentou que ainda não
chegaram aos órgãos de defesa do consumidor um número representativo de
reclamações quanto ao reajuste aplicado às tarifas de energia em todo o
País. "O que chega são reclamações de mau atendimento e baixa qualidade
dos serviços", disse.
Com relação ao repasse no reajuste do crédito de R$ 107,8 milhões em
Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o diretor
da Coelce afirmou não ter ido preparado para discutir a questão. "Só
queria fazer uma observação, de que esse foi um processo administrativo
que correu na Aneel, por seis anos, com várias audiências públicas e a
decisão final ocorreu este ano", disse.
Reajuste da conta em 2005 levou população às ruas
A concessão de reajustes exorbitantes na conta de energia e sua
posterior transformação em causa judicial não é uma ocorrência inédita.
Em 2005, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) concedeu
reajuste médio de 23,59% para Companhia Energética do Ceará (Coelce).
Na época, o Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor
(Decon-CE) entrou com pedido de revisão do aumento, e o juiz Francisco
Bezerra Cavalcante, da 18ª Vara Cível de Fortaleza, determinou a
suspensão do reajuste, limitando o índice de 11,3% como o máximo a ser
aplicado pela companhia.
Nas ruas, a população se mobilizou contra o aumento em protesto
organizado pelos integrantes da Central Única dos Trabalhadores do Ceará
(CUT-CE) e da Federação de Bairros e Favelas de Fortaleza (FBFF), em
frente à sede da Coelce, à época, na Av. Barão de Studart.
Os representantes das entidades comerciais e industriais chegaram a
redigir um documento, destinado aos parlamentares estaduais, solicitando
a revisão do reajuste. Após longa batalha judicial, o Pleno do Tribunal
Regional Federal da 5ª Região (TRF) decidiu, por unanimidade, negar o
recurso da Coelce que pretendia suspender a liminar expedida pelo juiz.
Quando as determinações pareciam correr a favor do bolso do consumidor,
o então presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF), em
Recife, desembargador Francisco de Queiroz Cavalcanti, suspendeu as
liminares que proibiam a Coelce de aplicar o reajuste médio de 23,59%. A
batalha judicial se estendeu por oito meses.
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