segunda-feira, 26 de maio de 2014

Dirigentes cogitam sanções a infiéis

Englobando lideranças com interesses pessoais e estratégicos divergentes, os partidos políticos têm encontrado dificuldade em comportar personalidades que, embora filiadas à mesma legenda, traçam caminhos opostos e por vezes criam situações constrangedoras às agremiações. A despeito desses impasses, dirigentes minimizam as diferenças, mas não descartam sanções contra os correligionários que praticarem infidelidade partidária nas eleições deste ano.
O entendimento da Justiça Eleitoral é que os mandatos pertencem aos partidos e não às pessoas. É essa lógica que limita a troca de partido de um parlamentar, que só fica livre de questionamentos judiciais se sair de uma legenda para se filiar a uma nova ou provar que sofre perseguições internas. Pelos critérios de fidelidade partidária, os filiados também devem se submeter às decisões coletivas das siglas, como apoio a determinados candidatos, ou pelo menos optarem pela neutralidade no pleito.
Na prática, é quase inviável aos dirigentes partidários ter controle sobre o que ocorre em todas as instâncias do partido. Por sua vez, mesmo quando têm total consciência dos "infiéis", muitas lideranças optam por fazer vista grossa às insubordinações. Nas eleições de 2012, alguns parlamentares chegaram a subir no palanque dos principais candidatos a prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio e Elmano de Freiras, mesmo contra a decisão interna da sigla.
O presidente do PDT no Ceará, deputado André Figueiredo, explica que a orientação da legenda em relação às eleições majoritárias (Senado Federal e Governo do Estado) é não aceitar nenhuma discrepância. "Ninguém pode forçar alguém a subir no palanque (apoiado pelo PDT), mas não pode subir no palanque da oposição", afirma.
O deputado relata que, após o pleito de 2010, o partido advertiu lideranças que estavam se manifestando em público contra as decisões da sigla e expulsou dois prefeitos que desobedeceram as deliberações partidárias. Já em 2012, ele ressalta que não foram identificados problemas. Figueiredo acrescenta que é mais difícil controlar opiniões pontuais de filiados, mas a responsabilidade é maior quando se tratam de parlamentares e dirigentes.
Divisão
Partido historicamente heterogêneo, o PT enfrenta hoje divisão interna sobre as candidaturas a governador e senador. A maioria dos delegados e parlamentares petistas no Ceará é ligada ao deputado José Guimarães, pré-candidato ao Senado e defensor do nome indicado por Cid Gomes ao Executivo. Já a ex-prefeita Luizianne Lins - que lidera um grupo minoritário contra a tese de Guimarães, mas ainda é considerada uma liderança forte - já declarou que não apoiará, em nenhuma circunstância, o postulante indicado por Cid.
O presidente estadual do PT, Francisco de Assis Diniz, aponta que os filiados têm tradição de seguir a posição da legenda. "Até o momento de deliberar, (a liderança) tem direito de se posicionar. Depois, a decisão é do partido. As que não se submetem ou ficam caladas ou pedem licença. Caso contrário, são submetidas a processo disciplinar", elucida.
Questionado sobre a possibilidade de a ex-prefeita Luizianne não se adequar às determinações petistas no Estado, Assis Diniz responde: "Não abriremos mão do cumprimento. No partido, tratamos todos igualmente. Ela é filiada e será tratada da mesma forma que todos". E acrescenta: "Se ela não se submeter, poderá responder a um processo disciplinar".
Após admitir que podem haver sanções a quem se posicione contra diretrizes partidárias, De Assis pondera que isso não é uma ameaça e que atua para garantir a unidade do PT. "Quando se quer unificar, tem que abstrair a valoração dos fatos. Se já declaro que tem isso (sanção), as pessoas vão achar que estou ameaçando", ameniza.
O deputado João Jaime trocou, em 2013, o PSDB pelo DEM, da base do governador Cid Gomes. Jaime destaca estar disposto a apoiar o senador Eunício Oliveira (PMDB) ao Governo do Estado e o tucano Tasso Jereissati ao Senado, caso ele confirme candidatura. A postura do deputado vai de encontro às articulações do seu novo partido, que deve permanecer aliado de Cid.
Desalinhamento
Para João Jaime, o desalinhamento partidário no Estado será resolvido internamente. Ele enfatiza que o presidente estadual da sigla, Moroni Torgan, deseja apoiar o candidato do PROS do governador, mas aguarda orientações nacionais. Mesmo divergindo da postura da legenda, Jaime minimiza as discordâncias e diz acreditar que a agremiação vai compreender sua situação.
"Se o partido resolver apoiar o candidato do governador, vou pedir que me libere, porque não tenho condições de apoiá-lo. Além de ser oposição, sou muito perseguido pelo Governo nos meus colégios eleitorais. O partido vai entender", aposta, ressaltando que já chegou a declarar apoio a Eunício Oliveira no plenário da Assembleia Legislativa.
O Diário do Nordeste tentou conversar com Moroni Torgan, mas a assessoria de imprensa do DEM afirmou que ele estava viajando em missão religiosa. O vice-presidente Chiquinho Feitosa está desautorizado a dar entrevista em nome da legenda, segundo determinação de Moroni.
O deputado Roberto Mesquita, do PV, também é crítico à gestão Cid Gomes, apesar de o correligionário Augustinho Moreira ser vice-líder do Governo na Assembleia. Mesquita, que é entusiasta da candidatura de Eunício, relata que o partido ainda está em processo de discussão para definir quem apoiará.
"Respeito as decisões partidárias e vou fazer as ponderações, mesmo ficando numa situação muito delicada. Vou tentar ficar independente, mas, na conjuntura política, a decisão é da maioria do partido", destaca. Mesquita acredita que não será necessário levar as discordâncias internas a instâncias superiores, como advertência ou expulsão do partido. "Prefiro pensar na unidade, que nós vamos discutir e encontrar o melhor para o PV e que os interesses individuais não sejam os principais", opina.
SAIBA MAIS
Oposição
Mesmo sem admitir, nas eleições de 2012, várias lideranças cometeram infidelidade partidária ao subirem em palanques que faziam oposição às determinações dos partidos aos quais esses políticos são filiados
Desalinhamentos
Há 32 partidos no Brasil. Não é raro o desalinhamento entre o que diz a executiva nacional das siglas e o que elas seguem nos estados, às vezes aliando-se a partidos que se opõem às suas legendas em nível nacional
Perseguição
Um parlamentar pode ter o mandato questionado na Justiça pelo antigo partido ou Ministério Público caso troque de agremiação, exceto se a sigla for nova ou a liderança provar que sofria perseguição política

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