domingo, 1 de junho de 2014

Bancadas evangélicas tentam ganhar mais espaço no Ceará

A fragilidade ideológica de partidos tradicionais no Ceará, aliada aos interesses de comunidades evangélicas em garantir uma maior representação política, abriu espaço para que agremiações voltadas para esse público se fortalecessem e assegurassem, cada vez mais, um número maior de pastores em parlamentos espalhados pelo Brasil. Já a quantidade de padres na disputa de cargos eletivos perdeu força, segundo cientistas políticos, por falta de incentivo dos fiéis e da própria Igreja Católica.

No Ceará, o cenário político acompanhou a tendência nacional, permitindo que legendas como o PSC, por exemplo, passassem de um partido sem representação na Câmara Municipal de Fortaleza à sigla com uma das maiores bancadas na Casa. Já o presidente nacional do PRB, Marcos Pereira, em recente visita ao Ceará, incentivou pastores a entrarem na vida política.

Na ocasião, Marcos Pereira fez uma palestra para cerca de 80 pastores para destacar a importância da participação dos cristãos na política partidária e na disputa pelos cargos eletivos. “Ao longo dos anos, a política foi demonizada pelos evangélicos. Enquanto isso, leis eram aprovadas para cercear nosso direito de pregar a Palavra de Deus”, alegou o presidente nacional.

Na avaliação do cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), o crescimento da representação evangélica se deve, em parte, à falta de bandeiras claras nos programas defendidos pela maioria dos partidos. “Os partidos tradicionais têm uma confusão geral em termo de ideologia. Então, um partido que apresente um programa organizadamente acaba atraindo votos de grupos que mais se identificam com aqueles valores”, ressalta o professor.

David Fleischer acrescenta que a maior exposição de deputados federais voltados para o público evangélico também foi responsável por, em nível estadual e municipal, atrair mais pastores para a vida política. “A bancada evangélica tem mostrado, no Congresso, relativo sucesso ao conseguir algumas vitórias. Isso impressiona bastante os fiéis, que ficam animados em ver que os valores da Igreja Evangélica são levados para uma esfera nacional”, explicou.

Campanha

O presidente estadual do PSC, Wellington Saboia, confia nos votos da comunidade evangélica para garantir crescimento do partido nas eleições deste ano. Afastado da Câmara Municipal de Fortaleza para se dedicar à organização da campanha, o vereador acredita que a candidatura do pastor Everaldo Pereira à Presidência da República incentivará cearenses evangélicos a votar nos candidatos do PSC a deputado estadual e federal. Um dos nomes nacionais da sigla é o pastor Marco Feliciano, que já presidiu a comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.

O PRB no Ceará também conseguiu crescer nos últimos pleitos, elegendo 17 prefeitos no Estado e mais 118 vereadores nas eleições municipais de 2012, apesar de muitos terem deixado a agremiação para se filiar ao PROS, quando o governador Cid Gomes foi para a legenda.

O presidente municipal do PRB, vereador Gelson Ferraz, afirma que, apesar do crescimento, a comunidade evangélica ligada ao partido não teve tanta influência. “Dentro do partido, de evangélico, só tem eu e o pastor Ronaldo Martins. A maioria é católica. Quem fez o partido crescer foi todo mundo. Ninguém perguntou se é católico ou evangélico”, alegou.

O partido não esconde, porém, a vontade em mudar esse retrato descrito por Gelson Ferraz. No evento em que o PRB organizou para incentivar pastores a entrar na vida política, o presidente estadual da agremiação, deputado estadual Ronaldo Martins, destacou as conquistas que podem ser alcançadas para o público evangélico quando há uma maior representação.

Filiações

“Sou o único deputado evangélico entre os 46 na Assembleia Legislativa do Ceará e conseguimos aprovar a entrada dos pastores em hospitais e presídios, o que antes era proibido”, frisou Ronaldo Martins. De acordo com o partido, a legenda conseguiu algumas filiações de pastores logo após o evento realizado na sede do PRB no Ceará.

Já o cientista político Thiago Sampaio, da Universidade Federal do Pampa, no Rio Grande do Sul, lembrou que o crescimento da representação evangélica não está ligada somente ao partidos que são ideologicamente compatíveis com os valores defendidos por igrejas evangélicas. “A bancada evangélica está distribuída por várias outras legendas, revelando até uma falta de clareza na coerência ideológica entre os parlamentares e os partidos que representam”, apontou.

Enquanto a Igreja Evangélica conseguiu construir uma maior representação, o catolicismo perdeu força na política. Para o cientista político Thiago Sampaio, os fiéis da Igreja Católica não enxergam a necessidade de ter representantes identificados com a religião que praticam. “Há essa diferença no pensamento difundido entre os fiéis das duas religiões”, explicou.

O cientista político David Fleischer lembrou que, além de não terem tanta aceitação entre os fiéis, essa diferença se deve principalmente ao fato da própria Igreja Católica ter passado a reprimir padres que tivessem o desejo de disputar algum cargo eletivo, enquanto a Igreja Evangélica incentiva esse hábito.

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