Futuro relator da reforma da Previdência Social quando a proposta chegar ao Senado,Tasso Jereissati (PSDB-CE) diz que o presidente Jair Bolsonaro queima capital político com questões inúteis e compromete cada vez mais a aprovação da mudança nas regras das aposentadorias, que deveria ser foco absoluto do governo.
“A primeira dificuldade vem do próprio governo, com bate-cabeças e bobagens ditas e feitas pelo presidente. Parece que Bolsonaro ainda não assumiu o papel de presidente da República do Brasil”, aponta em entrevista ao Valor Econômico.
“Ele está fomentando a discórdia. É a antítese do que um presidente quer para o seu governo. Ele não pode sair por aí dizendo qualquer coisa polêmica, às vezes fora da realidade, que pode até ser a opinião pessoal dele, mas não é a do país”, alerta.
Nunca antes
Tasso diz que, historicamente, nunca houve um momento tão propício para a reforma da Previdência, mas o tempo corre contra o governo e as maiores dificuldades sequer começaram. O tempo “ótimo” para o governo botar a reforma em curso, que seriam os dois primeiros meses de governo, já foi perdido, diz. “Na Câmara, tem que passar até julho. Voltando do recesso parlamentar sem ter resolvido na Câmara, vai ficar muito difícil. Passa uma coisinha ou outra, mas bem magrinha”.
Erro
A pressão das corporações e das redes sociais ainda nem começou a influenciar e será enorme, diz o tucano. Tasso critica também a estratégia do governo de tentar emplacar a desvinculação do Orçamento ao mesmo tempo que a reforma das aposentadorias, como forma de agradar os governadores e fazê-los trabalhar em favor da proposta para a Previdência. “Isso é um erro. Parlamentares ligados à área da saúde ou educação, por exemplo, que a princípio poderiam ser pró-reforma da Previdência, vão se indispor por causa da PEC da desvinculação. Você mais perde votos do que ganha”.
Ministros
Bastante crítico à atuação dos ministros da Educação, Ricardo Vélez Rodriguez, e – principalmente – das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, Tasso diz que há gente demais falando pelo governo, em direções diversas. “São vários grupos que não se dão entre si e têm opiniões que contrastam, em vários assuntos. O [ministro da Economia] Paulo Guedes traz uma agenda liberal, de forte abertura do Brasil ao comércio exterior. Uma política evidentemente globalista. E vem um outro, que é ministro das Relações Exteriores [Ernesto Araújo], fazendo discurso antiglobalista e influenciado por um filósofo, Olavo de Carvalho, com ideias absolutamente fora do padrão”.
Fora da base
Figura de proa do PSDB nas últimas três décadas, Tasso, de 70 anos, admite a proximidade à agenda econômica do governo, mas rechaça a hipótese de a sigla aderir formalmente à base aliada a Bolsonaro. Pelo contrário: diz que, se quiser ser uma alternativa para o futuro – e para as eleições presidenciais de 2022 – os tucanos devem caminhar mais na trilha da oposição. Da mesma forma, descarta que o PSDB vá se tornar um partido de direita, que dispute espaço com o PSL – como tem aventado aliados do governador de São Paulo, João Doria. “Esse espaço da direita está ocupado pelo PSL e pelo Bolsonaro. Não é nem nunca foi nosso. O nosso, mais do que nunca, é o da social-democracia”, diz. A questão dos costumes, na qual a agenda do PSL e do presidente é notadamente conservadora, é uma diferença clara, aponta. “Nosso espaço é este, uma visão liberal na economia, bastante liberal nos costumes e que vê o Estado como elemento regulador e atuante na questão dos desequilíbrios sociais”.
Oposição
Se os tucanos migrarem para a direita, garante, será oposição interna. Tasso, que recebeu o Valor em seu gabinete, no 14º andar do Senado, confirma inclusive que, olhando para fora, conversou com defensores da criação de uma nova alternativa de centro, como o ex-governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, e nomes não-tradicionais da política, como o apresentador de TV Luciano Huck e o ex-ministro do Supremo tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa.
E ainda
Decisivo na conturbada eleição do Senado que desbancou Renan Calheiros (MDB-AL) e elegeu Davi Alcolumbre (DEM-AP), Tasso é um conselheiro insuspeito do novo presidente do Legislativo, mas nega ser a cabeça pensante por trás do amapaense, até então um parlamentar do chamado baixo clero.
Com informações do Valor Econômico