A implantação de um aparelho dessalinizador mudou a
vida da Comunidade de Bom Jesus, distante 35 quilômetros da sede do
município de Canindé. O êxito da iniciativa virou exemplo no Sertão. Ao
contrário do que ocorre em outros locais onde o equipamento funciona,
aqui os moradores são responsáveis pelo gerenciamento e dividem os
custos operacionais. A outrora aguardada passagem dos carros-pipa virou
coisa do passado.
Sem a garantia de água potável todos os dias, a rotina dos assentados e
das comunidades rurais da região era marcada por incertezas e pela
presença frequente de carros-pipa e filas de crianças com diarreia no
posto de saúde Juarez Alves Pereira devido ao uso de água salobra e
imprópria para o consumo.
A mudança de uma situação de insegurança hídrica para a abundância de
água veio no início de 2009, quando foi instalada na localidade uma
unidade demonstrativa do Programa Água para Todos, do Programa de
Aceleramento ao Crescimento (PAC), uma parceria da Secretaria de
Recursos Hídricos e a Obras Hidráulicas do Governo do Ceará e do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que assegura o
acesso à água própria para o consumo humano para as 60 famílias de Bom
Jesus.
"O carro-chefe do programa é a água para beber. Antes, a gente tinha
que esperar carro-pipa ou bebia a água do Rio Cangati, que é salobra",
contou o responsável pela gerência do equipamento, José Oscar Vieira
Cavalcante, 63 anos, há seis cuidando do dessalinizador. Para ele, a
mudança na qualidade de vida das famílias pode ser vista na sala de
espera do posto de saúde da comunidade. "Agora não dá mais diarreia nas
crianças. O problema praticamente acabou. Antes, o posto de saúde vivia
cheio".
Além da água filtrada pelo dessalinizador, as 60 casas do Bom Jesus
também possuem cisternas de placas com capacidade para 16 mil litros,
cada uma, construídas em 2010 com recursos dos governos Federal e
Estadual. A água dessalinizada também abastece a Escola Padre José
Antônio e o posto de saúde Juarez Alves Pereira que funcionam no local, e
mais 600 famílias das comunidades vizinhas, como Targinos, Itarumã,
Juá, Vila Campos, Morada Nova, Monte Vilar, e Piedade.
Os moradores explicam que compartilham a água dessalinizada com
famílias de outras comunidades, principalmente quando a terra está mais
seca e a estiagem do Sertão nordestino se assevera. Segundo Francisco
Tarcísio Nascimento Silva de, 46 anos, é comum moradores de comunidades
da agricultura familiar, distante até 25 km, irem buscar água no
chafariz. "Não aceitamos que mude o gerenciamento do projeto. Outro que
tomar conta do dessalinizador fracassa. Quando pegar no dinheiro dará
outro destino. O Oscar aplica tudo em defesa dos moradores", disse
Tarcísio.
Prova disso foi o conserto de R$ 1.800,00 para uma bomba do poço. "O
técnico consertou e logo recebeu o dinheiro. A última conta de energia
foi R$ 101,00. O lucro diário com a venda da água é de R$ 25,00. Cada
ficha custa R$ 0,50 por 20 litros de água", mostrou Oscar com um caderno
cheio de anotações.
Ana Cleide, também moradora, é voluntária responsável pela entrega da
água às famílias. Ela explica que, todo dia, há distribuição de uma cota
de 40 litros de água a todos que pedem e que a comunidade estabeleceu
prioridades de acordo com as diferentes necessidades.
"Quem tem recém-nascido em casa ou é dono de mercearia pode pegar 60 litros. São dois mil litros de água por dia".
Projeto da UFC prevê criação de tilápia
A água salobra possui salinidade intermediária - entre 5% e 30% da
concentração de sal encontrada nos oceanos. Ela é retirada de um poço
com vazão de 2,7 mil litros por hora, cavado há seis anos pelo Governo
do Estado. Com o auxílio de uma bomba, a água abastece uma caixa com
dois mil litros da lavanderia comunitária e outra com capacidade para
cinco mil litros que armazena a "água bruta".
Depois, a água segue para o dessalinizador e, impulsionada por uma
bomba de alta pressão, passa por três tubos onde seis membranas e quatro
filtros retiram o sal.
Dessalinizada, pronta para o consumo humano, segue para uma caixa de
dois mil litros de capacidade, que abastece o chafariz com três
torneiras onde os agricultores de comunidades vizinhas pegam diariamente
sua cota de água potável: 40 litros.
Embora o equipamento tenha capacidade para dessalinizar até 900 litros
de água por hora, atualmente são processados apenas dois mil litros por
dia, o suficiente para atender às famílias da área e de comunidades
vizinhas. "Aqui ninguém se preocupa com carro-pipa. Quem tem coragem
pega água para o consumo humano, animal, tomar banho, lavar roupas na
hora que quiser", garante José Oscar.
"É o programa mais democrático de dessalinização existente em Canindé",
reconhece o Secretário da Agricultura e Recursos Hídricos do Município,
José Airton Maciel, que foi conhecer de perto a estrutura para levar ao
conhecimento de outras regiões.
Visita
Técnicos de municípios como Quixeramobim, Itapiúna, Choró, Itatira,
Madalena, Aratuba e Boa Viagem já vieram conhecer o projeto de gestão
ambiental dos moradores de Bom Jesus. O rejeito, ou seja, a água que não
é beneficiada no processo de dessalinização, segue para um tanque de
contenção, de onde é aproveitada para afazeres domésticos.
A Universidade Federal do Ceará (UFC) tem um estudo pronto para a
fabricação de dois tanques de 50 metros de comprimento por 17 de
largura, escavados no solo e forrados com lonas apropriadas. Neles são
criados peixes tilápia para aumentar a renda familiar dos habitantes.
"Já fizemos a doação do terreno e o técnico do Governo do Estado,
Antônio Favela, já esteve nos visitando e a implantação do projeto de
criatório depende apenas de tempo", garante Maciel.
O programa de dessalinização de água integrado à piscicultura vai
ganhar o apoio da Secretaria de Agricultura de Canindé, que vai fazer a
doação dos alevinos. Uma equipe voluntária receberá treinamentos e
passará a ser a responsável pela troca a cada três meses, pela
distribuição da água e ainda pelo controle das condições dos tanques de
peixes (temperatura, condutividade elétrica e nível de oxigênio da água)
e despesca.
Investimento
O Programa Água para Todos, do Plano Brasil Sem Miséria, tem como meta
recuperar, implantar e gerir 1,2 mil sistemas de dessalinização até o
fim de 2014, beneficiando 500 mil pessoas com investimentos de R$ 168
milhões.
Os recursos para o programa provêm de convênio firmado entre os
ministérios do Meio Ambiente (MMA), do Desenvolvimento Social (MDS) e da
Agência Nacional de Águas (ANA).
Mais informações
Programa Água para Todos
Ministério da Integração Nacional
Esplanada dos Ministérios - Bloco E Brasília- DF / CEP: 70.067-901 Telefone: (61) 2034-5800
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